"GANHAMOS EM 1º E 2º GRAU, POR QUE FARIA ACORDO?", QUESTIONA MINISTRO DO STJ AO CRITICAR CULTURA DE LITÍGIO
Resumo
MUDANÇA DE MENTALIDADE
"Ganhamos em 1º e 2º grau, por que faria acordo?", questiona ministro do STJ ao criticar cultura de litígio
Marco Buzzi apontou a resistência cultural e a ineficiência do Judiciário como entraves, defendendo a conciliação como um caminho mais rápido, barato e satisfatório para as partes.
Mauro Camargo
"Ganhamos em primeiro e em segundo grau. E agora você vem com uma conversa de tentar fazer um acordo? Está demitido!". Com essa anedota, que simula a reação de um cliente ao seu advogado, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Marco Buzzi, diagnosticou o que considera um dos maiores entraves para a eficiência da justiça no Brasil: a cultura da litigiosidade. Para o magistrado, a resistência em buscar soluções consensuais, especialmente após vitórias judiciais, alimenta um sistema sobrecarregado e ineficiente. A análise foi feita durante sua palestra no Congresso de Governança nos Conselhos Profissionais, na manhã desta quinta-feira, 9, em Brasília.
Buzzi defendeu uma profunda "mudança de mentalidade" e argumentou que, embora o Brasil tenha um dos sistemas jurídicos mais seguros do mundo — o da Civil Law, no qual o juiz é estritamente limitado pela lei —, a solução judicial raramente satisfaz plenamente as partes. Em contrapartida, os métodos alternativos, como a mediação e a conciliação, oferecem autonomia, agilidade e resultados mais eficazes.
Para ilustrar a dimensão do problema, o ministro apresentou dados impressionantes sobre o volume de trabalho no Judiciário. "Cada ministro do STJ recebe, em média, 1.250 novos recursos por mês. Nem quando eu era juiz da Fazenda Pública eu recebia tantos processos", comparou, destacando que essa é uma demonstração clara do "altíssimo índice de litigiosidade" do país.
Na esfera tributária, o cenário é ainda mais crítico. Segundo Buzzi, o Brasil acumula quase 18 milhões de execuções fiscais pendentes, que representam 52% de todas as ações de execução em geral. O valor total em disputa chega a R$ 5,68 trilhões. Além do volume, o tempo é um inimigo: um processo contestado leva, em média, sete anos e sete meses para ser concluído. "Andou rápido", ironizou o ministro sobre o prazo. "Fico satisfeitíssimo, demorei só sete anos para ver o julgamento final do meu caso."
Um dos pontos centrais da argumentação de Buzzi foi a diferença fundamental between uma decisão imposta por um juiz e uma solução construída pelas próprias partes. Enquanto o magistrado deve se ater estritamente ao que a lei e as provas determinam, em um acordo "as partes podem ir muitíssimo mais longe".
"Imagine uma disputa de terras onde a perícia define a divisa. Como juiz, tenho que determinar que a linha seja respeitada ali. Em um acordo, as partes podem decidir movê-la para onde bem entenderem, desde que não seja ilícito", exemplificou, “como sem prejudicar outros vizinhos.
Segundo ele, a sentença judicial cria uma dinâmica em que ninguém sai verdadeiramente satisfeito. "Quem perde a ação vai dizer que o juiz foi comprado. E quem ganha? Vai dizer: 'Uma sentença dessas, até eu faria. Pena que demorou dez anos. Que injustiça!'. Ou seja, não agradamos ninguém", afirmou. A solução consensual, por outro lado, é mais satisfatória porque é fruto da autonomia das partes e se resolve em poucos meses, não em anos.
O ministro ressaltou que o Brasil já possui um arcabouço legal robusto para incentivar a conciliação, citando a Lei da Mediação (Lei 13.140/2015) e a Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A legislação permite a "autocomposição" mesmo quando o Estado é parte do conflito, abrindo um leque de possibilidades na área fiscal.
No entanto, a existência da lei não basta. Para Buzzi, a transformação real depende de uma nova postura de todos os operadores do direito e gestores. Ele celebrou o evento como um fórum para resultados práticos.
"A conciliação tributária não é uma alternativa; é um caminho para a justiça fiscal e para a pacificação social", declarou. "Fico feliz em participar de um evento como este, porque ele tem efetividade. Não ficamos apenas conversando sobre sonhos. Aqui, descemos para o terreno do concreto, para discutir a operacionalidade dos sistemas e apresentar propostas novas. É isso que traz resultados concretos e efetivos", concluiu.
PAINEL 1 - CONCILIAÇÃO TRIBUTÁRIA: CAMINHOS JUDICIAIS E ADMINISTRATIVOS PARA UMA COBRANÇA MAIS JUSTA
Presidente de Mesa: Dra. Ana Paula Mello, Secretária da CCJ da Câmara dos Deputados.
Expositores:Ministro do STJ Marcos Buzzi; Dr. Rodrigo Rodrigues Buzzi (Advogado); Dr. Alberto Cabral, COFEN (Assessor Legislativo).
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