SISTEMA DE EXECUÇÃO FISCAL ESTÁ 'FALIDO', DEFENDE ADVOGADO EM CONGRESSO DE GOVERNANÇA

CONGRESSO NACIONAL DE GOVERNANÇA DOS CONSELHOS DE CLASSE 10/10/2025
por Mauro Camargo (jornalista)
SISTEMA DE EXECUÇÃO FISCAL ESTÁ 'FALIDO', DEFENDE ADVOGADO EM CONGRESSO DE GOVERNANÇA
Resumo

DESJUDICIALIZAÇÃO

Sistema de execução fiscal está 'falido', defende advogado em congresso de governança

Em painel, Rodrigo Buzzi apresentou um diagnóstico contundente sobre a ineficiência do Judiciário na cobrança de dívidas e propôs a delegação da tarefa a cartórios, inspirando-se em modelos europeus.

Mauro Camargo

Um sistema lento, caro e comprovadamente ineficaz. Com um diagnóstico contundente, o advogado e pesquisador Rodrigo Rodrigues Buzzi classificou o modelo brasileiro de cobrança judicial de dívidas como "falido" e defendeu uma mudança de paradigma: tirar a execução de créditos do já sobrecarregado Poder Judiciário. A proposta foi apresentada na manhã desta quinta-feira, 9, durante o "Painel 1 - Conciliação Tributária: Caminhos Judiciais e Administrativos para uma Cobrança mais Justa", no Congresso de Governança nos Conselhos Profissionais, realizado no teatro do Hotel Golden Tulip, em Brasília.

Diante de uma plateia formada por gestores e representantes de conselhos de todo o país, Buzzi argumentou que a insistência no modelo atual não é apenas um sintoma de morosidade, mas a prova de um sistema em colapso, que consome recursos públicos para entregar resultados irrisórios. A solução, segundo ele, passa pela "desjudicialização", um caminho que envolve aprimorar os mecanismos internos de cobrança e delegar a execução a agentes mais eficientes, como os cartórios de protesto.

O diagnóstico: um gigante adormecido

A fala do advogado partiu de uma premissa alarmante: mais de um terço de todos os processos que tramitam no Brasil são execuções fiscais. "Isso não é um sintoma de um Poder Judiciário apenas moroso; é o sintoma de um Poder Judiciário falido", declarou Buzzi. Segundo ele, o volume monumental de ações de cobrança impede que os tribunais se dediquem à sua função primordial, que é a de uniformizar a jurisprudência e resolver litígios complexos. "O Judiciário está em uma sala de UTI, tendo que se preocupar com a cobrança de créditos de quinhentos reais", ilustrou.

A falência do sistema, no entanto, não é apenas uma questão de volume, mas de resultado. Buzzi apresentou um dado que silenciou a plateia: apenas 2% das execuções fiscais no Brasil são frutíferas. "Ou seja, se eu busco recuperar cem reais, eu só consigo devolver dois. Não faz sentido promover uma execução que custa dez mil reais para buscar um valor de duzentos", explicou, apontando a completa falta de lógica econômica do modelo.

Essa ineficiência, segundo o especialista, está enraizada em problemas estruturais. O Brasil não possui um sistema unificado de busca de bens, os cartórios e os bancos não se comunicam de forma integrada e a legislação facilita a ocultação de patrimônio. "O Brasil é o país da blindagem patrimonial", afirmou, concluindo que o cenário é de "completa falência do sistema executivo".

Solução: olhar para fora e agir por dentro

Se o diagnóstico é severo, a solução proposta por Rodrigo Buzzi é pragmática e inspirada em modelos internacionais de sucesso. Ele destacou que o modelo de execução exclusivamente judicial, como o brasileiro, é uma raridade na Europa, compartilhado por apenas cinco países. A grande maioria já migrou para a desjudicialização.

O principal paradigma, segundo ele, é Portugal. O país, que também sofria com uma justiça morosa, promoveu uma reforma a partir de 2003, delegando os atos de execução para a figura do "agente de execução". Buzzi detalhou três mecanismos que tornaram o sistema português verdadeiramente eficiente:

  • Procedimento Pré-Executivo: Antes de iniciar a cobrança judicial, o credor pode acionar o agente de execução para realizar uma busca de patrimônio do devedor, sem custas ou honorários. Isso permite avaliar a viabilidade da execução antes de mobilizar a máquina judiciária.
  • Agente de Execução: Uma vez iniciada a execução, é o agente (e não o juiz) quem realiza os atos de constrição, penhora e leilão, tornando o processo muito mais ágil.
  • Lista Pública de Execuções Frustradas: Caso a execução não tenha sucesso, o nome do devedor é incluído em uma lista pública. A medida cria uma forte pressão social e de mercado para a regularização do débito. "Quem vai querer fazer negócios com alguém que consta publicamente nessa lista?", questionou Buzzi.

Caminhos imediatos para os Conselhos Profissionais

Enquanto a mudança estrutural no Brasil depende de projetos de lei que já tramitam no Congresso, o advogado enfatizou que os conselhos profissionais podem e devem adotar medidas imediatas para melhorar seus índices de recuperação de crédito. Ele ofereceu um roteiro prático, baseado em sua própria experiência na gestão financeira de entidades.

A primeira e mais fundamental recomendação é aprimorar os procedimentos internos de cobrança. "Um acordo de cooperação técnica entre o CNJ e os conselhos identificou que 95% das execuções fiscais promovidas por eles são de créditos inferiores a dez mil reais", informou. Em vez de judicializar essas dívidas de baixo valor, os conselhos deveriam investir em programas de refinanciamento, anistia parcial de juros, atualização cadastral e campanhas de recadastramento. O objetivo, segundo ele, deve ser "trazer de volta o profissional inadimplente para a tutela do conselho".

Em segundo lugar, Buzzi sugeriu o uso de uma ferramenta jurídica já existente: a produção antecipada de prova (art. 381 do Código de Processo Civil). Essa medida permite, com baixo custo e sem honorários de sucumbência, solicitar judicialmente a busca de bens do devedor antes mesmo de ajuizar a execução, funcionando como uma espécie de "procedimento pré-executivo" brasileiro.

Por fim, ele defendeu a criação de câmaras de mediação e conciliação dentro dos próprios conselhos, uma iniciativa para a qual, segundo ele, não há qualquer vedação legal ou constitucional.

Ao encerrar, Rodrigo Buzzi deixou uma reflexão sobre a mudança cultural necessária. A busca pela conciliação, segundo ele, deve acontecer "a todo momento", desde a fase administrativa até depois de uma sentença. "A lógica do 'tudo ou nada' não existe mais há muito tempo no mundo. Talvez o que precisemos para desobstruir o Poder Judiciário seja pensar em chegar a uma conciliação antes mesmo que os problemas surjam", concluiu.

 

PAINEL 1 - CONCILIAÇÃO TRIBUTÁRIA: CAMINHOS JUDICIAIS E ADMINISTRATIVOS PARA UMA COBRANÇA MAIS JUSTA

Presidente de Mesa: Dra. Ana Paula Mello, Secretária da CCJ da Câmara dos Deputados.

Expositores:Ministro do STJ Marcos Buzzi; Dr. Rodrigo Rodrigues Buzzi (Advogado); Dr. Alberto Cabral, COFEN (Assessor Legislativo).

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