24/03/2023 | Categoria: Congressos
Palestrantes avaliam que estados têm fôlego financeiro, mas medidas devem ser tomadas 

As finanças públicas de estados e municípios pautaram o primeiro painel do segundo dia de debates do Congresso Nacional de Gestão Pública. O economista e consultor legislativo Waldery Rodrigues Junior e o auditor da Secretaria do Tesouro Nacional, Fábio Dáquilla apontaram que os entes ainda têm certo fôlego financeiro, mas é preciso adotar medidas que busquem a otimização da administração pública, sob a perspectiva da discussão da Reforma Tributária. A mudança na regra terá impacto considerável no valor arrecadado com impostos. 

O debate foi mediado pelo procurador da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, Ricardo Benetti. O evento visa criar um espaço de debate relativo à eficiência da gestão pública, sob a perspectiva de redução de custos dos serviços públicos, a ampliação da arrecadação de tributos sem aumento da carga tributária e o aumento da eficiência dos serviços oferecidos à população.

O economista aponta que o gestor deve sempre fazer mais com menos recursos. Destacou que nos últimos 12 meses o Banco Central registrou um superávit de R$ 123 bilhões no país, sendo R$ 57 bi relativos à União e R$ 66,7 bi aos governos estaduais e municipais. 

Já a Dívida Bruta do Governo geral hoje consome cerca de 52% do Produto Interno Bruto, o que representa R$ 5,6 trilhões. Conforme o economista, a perspectiva é que se mantido o controle do endividamento, a tendência é que o percentual da dívida fique cada vez menor. 

Quando observada a repartição da receita pública, a transferência chegou a 4,81% do PIB em 2022, considerado o maior número da série histórica. Ao todo são 16 tipos de transferências. 

Desse bolo, R$ 218 bilhões ficaram com estados e R$ 255 bilhões com municípios. Em que pese os números sejam animadores, Waldery Rodrigues Júnior faz um alerta: é preciso cuidado. 

“Precisamos avaliar como os estados se comportam. Eles estão com fôlego, mas até onde isso dura? É preciso encontrar soluções particulares para cada estado no que diz respeito a servidores, previdência, custeio”. 

A capacidade de pagamento (CAPAG), avaliação de risco feita pelo Tesouro Nacional, que avalia a situação fiscal de estados, municípios e Distrito Federal para saber se são capazes de honrar os seus compromissos, mostra que a gestão pública tem evoluído. Isso porque muitos estados migraram de avaliação D para C e de B para A. 

“Não existe política social bem feita se a fiscal não for robusta. Por isso o gestor precisa estar atento ao planejamento, à gestão, à política econômica, à capacidade fiscal. É preciso diversificar a pauta econômica e avaliar como é possível aumentar a produtividade. Nesse contexto, a educação ganha força, a saúde, o saneamento básico. Deve-se cuidar da ciência, tecnologia e inovação. Quanto mais for feito de maneira madura, melhor como solução contínua. Temos ainda um tema que sempre retorna, que é o da previdência social”.

Waldery Rodrigues Júnior ainda acrescentou que o país crescerá quanto mais fizer o seu dever de casa, gastando bem, com prioridade e transparência.

Reforma Tributária 

O auditor da Secretaria do Tesouro Nacional Fábio Dáquilla trouxe a discussão baseada no que os gestores devem esperar diante da possível aprovação da Reforma Tributária, que está em discussão no Congresso Nacional.

Dáquilla pontuou que a reforma é necessária uma vez que no Brasil a tributação sobre o consumo é brutal, chegando a 74,8%, mecanismo que penaliza os menos favorecidos. Em outros países que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) esse volume chega a 34%. Quando o pobre paga mais impostos que o rico, isso aprofunda as desigualdades. 

Para se ter ideia, quem ganha até dois salários-mínimos, paga 46% de imposto, enquanto quem recebe mais de 25 salários-mínimos apenas 18%. 

“Há uma ineficiência do sistema. Temos o pior sistema tributário do planeta. Há 20 anos o Brasil cresce menos que seus pares, está estagnado nas últimas décadas. Passaram reformas, mas não foi possível tirar a bola de canhão amarrada na perna do país. Não anda para frente e há uma combinação terrível com a insegurança jurídica”. 

Dáquilla ressaltou que 1.500 horas do ano são destinadas para pagar tributos e isso gera ineficiência. Além do mais, são 400 mil normas tributárias geradas no Brasil, o que significa dizer que em média são confeccionadas de 30 a 40 novas normas por dia. Isso gera um grande contencioso fiscal. E para que tudo isso fique em conformidade com o Fisco, são desembolsados R$ 180 bilhões por ano, o dobro do que é investido no Bolsa Família. 

Além disso, o sistema tributário não está preparado para lidar com a nova economia, que tem na internet a sua principal plataforma. “Como abre um negócio na internet e calcula alíquotas em mais de 5 mil municípios? O país não está preparado e precisa rever isso agora”, destacou. 

A reforma que está sendo discutida visa mudar a tributação para o local de destino, ou seja, o tributo será cobrado onde produto é consumido. Isso implica dizer que se a reforma for aprovada, os municípios que são grandes produtores perderão parcela considerável de recurso e os que são grandes consumidores terão acréscimo de receita. 

Há também a expectativa de se cobrar um único imposto não cumulativo. Isso vai fazer com que serviços tenham um aumento de alíquota, que deve ser 25%. Essa simplificação da tributação gera crescimento. 
Estudos apontam que apenas a simplificação pode ampliar em 4% a economia brasileira nos próximos anos. Já cálculos mais ousados consideram que esse patamar pode chegar a 20%, destravando assim o crescimento que está estagnado nas últimas décadas.

Ainda é esperada com a reforma o fim da guerra fiscal, o que vai fazer empresas procurarem assim os locais que ofereçam melhor estrutura para escoamento da produção. 

Para Dáquilla, essas mudanças trarão impactos às localidades que se valem exclusivamente dos benefícios fiscais para atrair investidores. Desta forma, ele insiste que não é preciso esperar a reforma tributária nacional e cada ente deve fazer a sua parte em busca de uma melhor gestão fiscal. 

“Não dá para esperar. É preciso que os entes passem pelo desafio local e façam as suas próprias reformas. Cuidar da despesa, diminuir o gasto, buscar a eficiência administrativa. A reforma tributária é competência de estados e municípios também. Ainda que a reforma nacional não prospere, traga a sua própria reforma. Se acha que elas são impopulares, espere até ficar sem dinheiro para pagar salários”. 

Entre as medidas locais que podem ser adotadas está a regularização de imóveis para que ocorra a arrecadação de ITBI, simplificação das normas locais, a formalização do comércio, atrair empresas e se adaptar a nova economia, buscando soluções também para tornar os negócios físicos mais atrativos. 

Dáquilla acredita que a reforma não deva ser aprovada neste primeiro semestre, como pretende o governo federal. No entanto, considera que alguma mudança, mesmo que “fatiada” passe no Congresso, uma vez que há um consenso teórico de que alguma coisa tem que ser feita.

 

  o autor | Autor: Michely Figueiredo
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