19/05/2023 | Categoria: LGPD
Regulamentação das Redes Sociais

Se fisicamente não podemos tudo, online também não podemos, diz ministra favorável à regulação das redes

A ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral, Maria Claudia Bucchianeri, defendeu a regulamentação das redes sociais durante palestra realizada no seminário “Sociedade em Rede e Acesso à Informação: (Des)Caminhos da Democracia”, realizado na manhã desta sexta-feira (19), em São Paulo. O evento é organizado pela Academia Brasileira de Formação e Pesquisa (ABFP) e pelo Instituto BRICS.

Para a ministra, a sociedade brasileira vive um momento de transformação semelhante ao visto na Revolução Industrial. No entanto, desta vez a revolução se dá no âmbito digital.

“Precisamos discutir formas de regulação sim. É uma emergência necessária. Não tem nada a ver com censura. Só deve ser modulada, assim como é na vida real. É necessário tomar a sério esse debate para que tenhamos uma regulação segura, confiável e pensada da internet no Brasil”, ponderou a ministra, ao falar para um público formado por advogados, empresários, políticos e gestores estaduais.

Para fundamentar sua posição, Bucchianeri trouxe dados do Brasil sobre o comportamento na internet. Conforme a ministra, hoje o brasileiro passa em média 10 horas diárias na internet, sendo 65% deste tempo em aplicativos de rede social. Além do mais, uma pesquisa realizada pelo Senado mostra que 75% dos ouvidos têm como fonte primeira de informação o WhatsApp.

“É natural nesses momentos de transição, como se vive no mundo das redes, termos uma regulação imposta. Alguma regulação precisa existir. Não tenho dúvida. A forma, o modelo, precisamos discutir”.

Bucchianeri ressalta que a forma de consumo mudou, assim com a maneira de se relacionar e se informar. Aponta que nesse momento disruptivo, as fontes de informação precisam ser confiáveis e hoje não se sabe mais de onde vem essa informação, uma vez que todos se tornaram emissores com a democratização da internet. E isso influencia diversos setores da vida.

A ministra cita que esse contexto ficou evidenciado nas campanhas eleitorais de 2018 e 2022, mas sobretudo no momento da pandemia de covid-19, quando as redes foram tomadas por conteúdos que disseminaram desinformação sobre a vacinação e as medidas de biossegurança, como a eficácia ou não do uso de máscara.

Abordou ainda o avanço do e-commerce, que fez com que os gastos com propaganda na internet sofressem um acréscimo considerável. “Nunca se gastou tanto em publicidade como se gasta no Google e temos problemas adicionais. Temos uma inteligência artificial se desenvolvendo rápido. Ainda estamos adaptando enquanto sociedade para viver em rede. Vamos passar ainda pela discussão envolvendo a inteligência artificial. Temos casos de textos feitos pela inteligência artificial que passaram em provas da OAB, em vestibulares e não sabemos de onde coletou as informações. Como vamos remunerar esse conteúdo que inteligência artificial varreu e usou para fazer o texto? Precisamos parar e pensar um pouco que sociedade queremos”, problematizou.

Uma das plataformas destacadas pela ministra do TSE como causadora de maior preocupação seria o Youtube, considerada “arisca, complexa e com algoritmos fechados e normas de comunidade inacessíveis” pela magistrada.

Conforme dados apresentados pela palestrante, 1,5 bilhão de horas são gastas no mundo consumindo vídeos hospedados no Youtube. Entretanto, 70% desses conteúdos são direcionados pela plataforma através daferramenta autoplay ao usuário. O algoritmo, a partir de uma leitura do comportamento do consumidor, faz sugestão de conteúdos semelhantes, medida que “empurra” o internauta para uma condição cada vez mais extrema e de “bolha”, sem que ele tenha feito essa busca, através de um modelo de sugestão da plataforma. 

“Os vídeos são cada vez mais extremos e te jogam para a ponta. Vídeos extremistas, permeados de desinformação que você nunca procurou e não sabia que existia. Se o Youtube entendesse que você tinha uma dúvida sobre a urna eletrônica, no quarto vídeo já havia um conteúdo de que a urna não funciona. Foi o Youtube que te levou a isso”, explica a ministra.

Diante desse cenário, a ministra substituta do TSE expõe que ao mesmo tempo em que a internet é capaz de dar voz, ela pode também calar muita gente. A magistrada também questiona o perfil dos programadores dos algoritmos. Esses profissionais não podem ser formados apenas por homens brancos, sob pena de tornar o sistema excludente.

A ministra pondera que o algoritmo precisa respeitar ainda aspectos locais, caso contrário corre o risco de não atender a questões culturais e reforçar cada vez mais as desigualdades.

“A vida em sociedade cobra regras. Existem comportamentos possíveis ou não no mundo virtual. São necessárias balizas de convivência, parâmetros de sociabilidade. Quem fatura milhões não deve ser questionada?”, questiona.

Nos Estados Unidos, considerado um dos países que mais prezam pela liberdade da manifestação do pensamento, tramitam três projetos de lei propondo que o Youtube não pode ser usado no período eleitoral. “Isso não ter a ver com censura, mas com regular um ambiente que é mercadológico. As plataformas criam artifícios para prender o seu olhar. Cada segundo a mais na tela vale dinheiro. É a economia da atenção”, explicou a ministra.

Bucchianeri amplia a discussão e defende que é preciso quebrar monopólios e dizer claramente o que é conteúdo permitido e proibido nas plataformas. E para justificar seu posicionamento citou o movimento Red Pill, que prega o machismo explícito nas redes, acentuando o extremismo nesta questão. Ainda de posse de uma pesquisa do Internet Lab, feita juntamente com o Instituto das minas, a ministra apresentou dados resultantes de um monitoramento feito em postagens de comentários de candidatos e candidatas, para mostrar a diferença como homens e mulheres são tratados nas redes do país.

Candidatos, quando xingados nos comentários, eram adjetivos relacionados a gestão, como corrupto, bandido, ladrão, incompetente. Já as candidatas receberam adjetivos relacionados a sua aparência, raça e sexualidade. Por exemplo, porca, vaca, feia, vagabunda e as mulheres negras foram mais agredidas nesse ambiente virtual.

“A gente percebe o quanto é perigoso esse mundo da polarização que a rede nos joga. É um viés de confirmação mais extrema. Só escutamos o que o algoritmo acha que queremos, com menos acesso à diversidade”.

A pesquisa ainda mostrou que a polarização religiosa entrou na polarização política ao analisar como as esposas dos candidatos nas eleições presidenciais de 2022 foram tratadas nas redes. Enquanto Janja foi rotulada como “macumbeira vagabunda” por ser adepta do Candomblé, Michelle Bolsonaro foi a “crente falsa, vagabunda”.

“Se fisicamente não podemos tudo, online também não podemos”, disse a ministra para reforçar a necessidade da regulação no Brasil. Ela ainda pontuou que esse é um debate mundial e deve avançar cada vez mais.

  o autor | Autor: Michely Figueiredo
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